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O momento para impetração do mandado de segurança preventivo

O mandado de segurança é uma ação prevista no artigo 5º, inciso LXIX da Constituição, e regulada pela Lei 12.016/2009. É cabível para proteger direito líquido e certo sempre que uma autoridade agir ilegalmente, causando uma lesão, ou se houver um justo receio de sofrer a lesão, nos termos da Lei 12.016/2009 [1]. Dessa forma, para a impetração do MS são necessários dois requisitos fundamentais, quais sejam: direito líquido e certo e ato de autoridade. Antes de aprofundarmos o tema, é necessário firmar premissas sobre o conceito de “direito líquido e certo” e “ato de autoridade”.

Pois bem, o direito líquido e certo está relacionado com a possibilidade de o juiz examinar as provas pré-constituídas e verificar se elas condizem com o contexto fático alegado. Por esse motivo, a liquidez e certeza do mandado de segurança não estão relacionadas com a complexidade da matéria do direito, e sim com a coerência entre os fatos alegados e os documentos acostados aos autos. Portanto, a complexidade da matéria não é uma justificativa para que o mandado de segurança seja extinto por falta de direito líquido e certo, bastando haver a relação entre as provas pré-constituídas e o fato alegado na petição. Nesse sentido entende o eminente jurista Rodrigo Dalla Pria [2], veja-se:

“Significa dizer que, por mais complexa que seja a questão normativo-interpretativa eventualmente levada a juízo, não poderá o julgador, nestas situações, desincumbir-se do dever de apreciação do mérito da demanda sob o pretexto da ‘ausência de direito líquido e certo’”.

Necessidade de identificação da autoridade coatora

Já o ato de autoridade é um ato administrativo praticado por uma autoridade competente. No ramo do Direito Tributário, o ato de autoridade é referente à constituição do crédito tributário. Porém, ele não corresponde somente ao ato de constituição do crédito tributário em si, mas às formas coercitivas para cobrar o crédito, como, por exemplo, a apreensão de mercadorias com objetivo de cobrar o tributo, a qual é considerada um ato de autoridade que justifica a impetração de mandado de segurança. Ademais, a autoridade coatora pode ser qualquer pessoa apta a cobrar o tributo, ou seja, a pessoa que tiver a capacidade tributária ativa, não sendo necessariamente um servidor público.

pressfoto/Freepik

A identificação da autoridade coatora no mandado de segurança preventivo é uma dificuldade técnica-processual, uma vez que não se tem certeza de quem será a autoridade a realizar o ato que está na iminência de acontecer, diferentemente do mandado de segurança repressivo, no qual a autoridade coatora já é conhecida, pelo fato do ato ilegal já ter sido praticado.

A necessidade da correta identificação da autoridade coatora ocorre para a indicação do foro competente para o ajuizamento da demanda, bem como pela formação necessária do litisconsorte com o ente representado pela autoridade. Para identificar a autoridade coatora que poderá vir a praticar o ato ilegal, a parte autora deve buscar pela legislação local e pela jurisprudência, a fim de evitar prejuízos futuros.

Cabimento e distinções entre mandados

Firmadas as premissas, passa-se à análise da diferença entre mandado de segurança preventivo e mandado de segurança contra lei em tese.

O mandado de segurança preventivo pode ser equivocadamente impetrado quando for contra lei em tese. Isso quer dizer que, para a impetração do mandado de segurança preventivo, há de ser demonstrado o justo receio que justifique a movimentação da máquina do Poder Judiciário, não podendo ser impetrado contra uma norma geral e abstrata que não seja passível de subsunção ao caso concreto posto pela impetrante.

O mandado de segurança preventivo será cabível somente na existência de uma lei cuja regra-matriz de incidência possua os critérios nos quais seja possível fazer a subsunção da norma à atividade do contribuinte.

Spacca

Sendo assim, chega-se ao seguinte questionamento: é possível impetrar mandado de segurança contra lei que está no período da vacatio legis ou no período da anterioridade tributária?

Para responder à pergunta, faz-se necessário firmar a premissa do conceito de vigência. Pode-se definir vigência como a aptidão da norma jurídica para produzir efeitos, ou seja, uma norma vigente é aquela que poderá irradiar efeitos no caso de a hipótese normativa se concretizar.

Com a premissa firmada, é correto afirmar que a norma jurídica que ainda está no período da vacatio legis ou no período da anterioridade tributária são normas jurídicas que não estão vigentes, pois não podem produzir efeitos se o fato descrito acontecer. Portanto, entende-se que não é possível impetrar mandado de segurança para se prevenir de uma lei que ainda não está em vigor, por configurar mandado de segurança contra lei em tese.

Todavia, se o autor da ação comprovar que o Fisco não está respeitando a vacatio legis ou a anterioridade tributária e cobrando o tributo de outros contribuintes, poderá impetrar o mandado de segurança, desde que comprove a iminente ação do Fisco.

Desse modo, se a lei ainda não estiver em vigor, não há que se falar em mandado de segurança preventivo. Ademais, se a lei já estiver vigente e a regra-matriz de incidência tributária não guardar relação com a atividade do contribuinte, também não haverá a iminência de um ato de autoridade.

Cabimento contra Difal

Para exemplificar podemos utilizar o caso do Difal, que foi regulamentado pela Lei Complementar 190/2022, publicada no dia 5 de janeiro de 2022. Pelo princípio da anterioridade anual, o Difal só poderia ser cobrado no próximo exercício financeiro, portanto não caberia mandado de segurança preventivo contra a cobrança do Difal em 2022, pois seria mandado de segurança contra lei em tese.

Acontece que a Fazenda estava cobrando o tributo em questão nos casos em que a hipótese normativa ocorreu ainda em 2022, de tal forma que estava cobrando o tributo instituído em 2022 no mesmo ano da publicação da lei.

Nessa hipótese é cabível mandado de segurança preventivo, desde que o contribuinte mostre seu justo receio, juntando os autos provas que mostrem a cobrança do tributo em situações semelhantes ao caso do contribuinte que impetrará o mandado de segurança.

 


Referências

BRASIL. Lei Complementar n. 190, de 4 de janeiro de 2022. Altera a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), para regulamentar a cobrança do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto. Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp190.htm. Acesso em: 24 out. 2024.

BRASIL. Lei n. 12.016, de 7 de agosto de 2009. Disciplina o mandado de segurança individual e coletivo e dá outras providências, Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12016.htm. Acesso em: 24 out. 2024.

PRIA, Rodrigo Dalla. Direito Processual Tributário. Editora Noeses. 1. ed. São Paulo: Noeses, 2020

 


[1] Art. 1o Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

[2] PRIA, Rodrigo Dalla. Direito Processual Tributário. 1. ed. São Paulo: Noeses, 2020. Pág. 375




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